Há tempos, visito e “devoro” o site Brinca Brincando, dedicado a atrações televisivas que marcaram Portugal do
final da década de 70 até os anos 90. João Costa e Nuno Sobral, responsáveis pelo
conteúdo, rememoram desenhos, programas, séries e, especialmente, novelas,
portuguesas e brasileiras. Com um visual bacana, textos muito bem elaborados, e
imagens de arquivo agregadas a preciosas informações, João e Nuno transformaram
o Brinca Brincando num dos melhores sites sobre história da TV. Por este motivo,
convidei ambos para desenvolverem o texto que vocês irão conferir abaixo, sobre
o sucesso de Pedra Sobre Pedra em
terras portuguesas. Obrigado pela participação, meninos! Espero poder contar
com vocês sempre!
Pedra
Sobre Pedra
Exibição:
16/11/1992 – 23/07/1993 (RTP 1)
A estreia de Pedra sobre Pedra, anunciada com quase um ano de antecedência, foi
rodeada de grande expectativa. Desde 1977 que as novelas brasileiras ocupavam
um lugar cativo na programação dos dois canais da RTP e, mesmo após a
implementação de produções nacionais, continuaram tendo índices de audiência
muito significativos. Tudo começou com Gabriela,
um sucesso de dimensões inéditas que não só parava o país, como influenciava o
horário das votações da própria Assembleia da República. Seguiram-se O Casarão e O Astro, bem como Escrava
Isaura, que inaugurou um novo horário. Até à estreia de Pedra sobre Pedra, com exclusão das
minisséries, já tinham passado 54 telenovelas brasileiras (46 da Globo, 6 da
Manchete e 2 da Bandeirantes), com destaque para Água Viva, Pai Herói, O Bem-amado, Guerra dos Sexos, Vereda
Tropical, Roque Santeiro, Sassaricando, Vale Tudo e Tieta.
Aquando da estreia de Pedra sobre Pedra
no Brasil, as principais atrações da RTP eram Rainha da Sucata e Pantanal.
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A atriz Laura Soveral, em Duas Vidas (Globo, 1977). |
Não era esta a primeira vez que atores
portugueses entravam para o elenco fixo de uma produção brasileira do género.
Já tínhamos visto em O Casarão a
consagrada Laura Soveral, que veio a atuar ainda em Duas Vidas, de Janete Clair. É também conhecido o trabalho de Tony
Correia (O Casarão e Locomotivas), de Sinde Filipe no remake de António Maria e, embora não se fale muito, Irene Cruz e João
Lourenço já tinham participado em Os
Deuses estão Mortos, de Lauro César Muniz, na TV Record em 1971. Desta vez,
porém, a RTP ia contribuir para a produção em cerca de 15%, ganhando uma quota
nos lucros e nas exportações.
Ao longo de 1991, a direção da
televisão pública portuguesa anunciou o projeto desta co-produção, a telenovela
Garimpo, depois chamada de Resplendor e que no final desse ano já
seria conhecida pelo seu título definitivo: Pedra
sobre Pedra. Sabia-se que seria escrita por Aguinaldo Silva, o mesmo autor
da popularíssima Tieta, acabada de
passar na RTP 1.
Na imprensa portuguesa, foram feitas
várias reportagens sobre as primeiras cenas com Carlos Daniel e Suzana Borges,
gravadas em Linhares, no distrito da Guarda, e a TV Guia chegou a entrevistar de forma muito rápida a senhora que
encarnou fugazmente a avó de Ernesto e Inês, uma natural da aldeia onde
decorreram as filmagens.
Também foi dado destaque às cenas
externas gravadas em Lisboa no final da novela, em junho de 1992, onde
assistimos à despedida da protagonista Pilar Batista.
A data da estreia foi rodeada de
grande mistério. Havia o dilema entre lançar a novela quando ainda estivesse em
exibição no Brasil ou adiá-la para novembro, inserindo-a na grelha de programação
de outono, altura em que são anunciadas as grandes atrações. Por outro lado,
estava agendada para outubro a chegada da SIC, nova emissora de televisão e
sócia da Rede Globo, que, neste quesito, faria uma forte concorrência à RTP.
Assim, se Pedra sobre Pedra começou
por ser anunciada para junho de 1992, em substituição de Rainha da Sucata (o maior sucesso de audiências daquela época), a
verdade é que acabou por se converter no trunfo para destronar a concorrência,
e ficou guardada para substituir Meu Bem,
Meu Mal, apesar de ter sido publicada na revista TV Guia, para despistar, a notícia de que ainda seria precedida de O Dono do Mundo.
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Cristiana Oliveira como Paloma, em cena de De Corpo e Alma, na sua exibição na SIC. |
Em outubro de 1992, o lançamento de Pedra sobre Pedra deu início a uma
estratégia inédita até então. Lima Duarte e Nívea Maria vieram a Portugal
promover a novela, sendo convidados para diversos programas. Sabia-se que a
SIC, entretanto inaugurada no dia 6 desse mês, ia estrear De Corpo e Alma a qualquer momento e que faria pressão para, no
futuro, ter preferência na escolha das novelas. Segundo estava previsto, Meu Bem, Meu Mal acabaria no dia
03/11/1992, na RTP 1, e Pedra sobre Pedra
iria suceder-lhe no dia 04/11/1992, uma quarta-feira. Não se sabe se a
informação vazou da SIC ou da RTP, o certo é que às 20 horas e 40 minutos da
segunda-feira dia 02/11/1992, ambas as estações, para se anteciparem,
anunciaram para esse mesmo dia a estreia das suas novelas e, assim, Pedra sobre Pedra e De Corpo e Alma começaram quase em simultâneo. Ou seja, na semana
de 02 a 06 de novembro, a novela Meu bem,
Meu Mal foi exibida em doses mais curtas, seguindo-se o capítulo do dia de Pedra sobre Pedra. Barriga de Aluguel, que ia ao ar na RTP 2 após o termo de Meu Bem, Meu Mal, mudou de horário
durante essa mesma semana e foi ao ar às 23 horas, evitando-se deste modo a
concorrência da novela do segundo canal.
Pedra
sobre Pedra acabou
por ser vista na versão original com 179 capítulos e não na versão
internacional, de 140 capítulos de 50 minutos, sendo uma exceção em face das
novelas que eram veiculadas por aqui desde 1989, altura em que passámos a ver
as produções da Globo em formatos para exportação. A audiência dos primeiros
meses superou a que Meu Bem, Meu Mal tinha
registado no seu início, e esmagou a concorrência, pelo que a SIC optou por
mudar, ao fim de pouco tempo, o horário de De
Corpo e Alma para meia hora mais cedo.
Pedra
sobre Pedra também
marca o fim da hegemonia da RTP sobre as audiências. Nunca mais nenhuma novela
registaria um índice tão elevado porque, a pouco e pouco, o público migrou para
a SIC, que, no ano de 1994, ficou com o exclusivo das novelas da Globo,
passando a mostrar, para além das novas produções, os antigos sucessos, outrora
vistos na RTP, mas em versões mais reduzidas.
Todavia, uma vez que tinha contribuído
para a produção de Pedra sobre Pedra,
a RTP teve esta novela na sua disponibilidade durante bastante tempo, pelo que
não foram poucas as vezes em que a mesma voltou ao ar, sempre com boa recepção.
Assim, em 1996, Pedra sobre Pedra
apareceu de novo na RTP 1, primeiro às 18 e depois às 19 horas, fazendo alguma
concorrência à reprise de Renascer e
à inédita Quem é Você. Em 1999, foi a
vez da RTP África apresentar a novela, também ao fim da tarde, com um horário
alternativo às 9 da manhã. Por fim, em 2001, Pedra sobre Pedra voltou à RTP 1, com exibição à hora do almoço.
por
Nuno Sobral
colaboração
de João Costa
imagens Brinca Brincando e João Costa
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