quinta-feira, 11 de dezembro de 2014


As “novas” novelas
Uma análise de O Dono do Mundo e Tropicaliente, últimas estreias do Viva.

Entre o final de outubro e o começo de novembro estrearam as novas novelas do Canal Viva: O Dono do Mundo, à 00h00, e Tropicaliente, 15h30. Ambas com a árdua missão de manter os números e a repercussão de suas antecessoras; respectivamente, Dancin’ Days e História de Amor. Passada a ressaca das novelas anteriores, e com ambas as tramas atingindo um mês de exibição, já é tempo de fazer uma análise mais detalhada do que O Dono do Mundo e Tropicaliente nos oferece, em termos de trama, elenco e produção.

A reprise de O Dono do Mundo nos permite elucidar os motivos que levaram à rejeição da trama. Márcia (Malu Mader) se entregar a Felipe (Antonio Fagundes), apenas três ou quatro dias após conhecê-lo, soou pouco convincente. É claro que Felipe usou de toda a sua dissimulação para conduzir o jogo de forma que ele saísse vitorioso, e que Walter (Tadeu Aguiar) menosprezou as vontades da mulher, privilegiando o trabalho. O que incomodou, e bastante, foi ver Márcia, mesmo desamparada por Felipe após a morte de Walter, continuar se iludindo, a ponto de tornar a se encontrar com ele e insistir em acreditar em suas mentiras, mesmo com dezenas de evidências apontando para o caráter sórdido do cirurgião. É difícil ver uma pessoa se rastejando por alguém que não a quer, quando na verdade deveria estar sofrendo pela culpa de ter causado a morte de um noivo tão bonzinho, seguindo um pensamento simplista, comumente adotado pelo telespectador médio. Mais: Gilberto Braga pretendia, com a novela, criticar as elites. Mas a trama foi construída de tal forma que a tal “elite” soa muito mais inteligente do que os pobretões que engana. E não são poucos os enganadores e enganados! Além de Márcia seduzida por Felipe, tivemos Xará (Jorge Pontual) caindo na lábia de Constância (Nathália Timberg) e Taís (Letícia Sabatella) sendo conduzida por Olga (Fernanda Montenegro), quase sem notar, ao caminho da prostituição de luxo.

O perfil realista dos personagens, se agride por um lado, por outro traz desempenhos brilhantes do elenco competentíssimo de O Dono do Mundo. Fernanda Montenegro está soberba como Olga, sempre distribuindo tiradas politicamente incorretas; Nathália Timberg deita e rola com Constância, muito bem amparada pelo apagado Altair, de Paulo Goulart; e Maria Padilha já nos faz detestar sua Karen. Cabe destacar também Stenio Garcia (Herculano) e Cláudio Corrêa e Castro (Vicente). O trio de protagonistas (Antonio Fagundes, Glória Pires e Malu Mader) também defende com primazia os seus personagens. E quanto talento vemos em Daniela Perez, a Yara. A cada cena dela, sentimos um aperto no peito. Triste...

Outra estreante de O Dono do Mundo, Letícia Sabatella, também se sai muito bem como Taís. Seu parceiro de cena, Ângelo Antônio, o Beija-Flor, está correto, mas o personagem não vai além das discussões sobre honestidade, o que o torna chato. No geral, os casais da novela não agradam. Impossível torcer por Felipe e Márcia, como a sinopse original previva, difícil querer a obstinada Taís com o apagado Beija-Flor, e desestimulante ver Stella (Glória Pires) se sacrificando para salvar o depressivo Rodolfo (Kadu Moliterno). Cenários e figurinos são arrasadores! Enquanto a classe alta exibe apartamentos belíssimos, o pessoal do subúrbio se abriga em casas concebidas com muita veracidade, diferente dos tempos atuais, em que casa de pobre em novela é entulhada de elementos vendidos à exaustão pela Globo Marcas.

Para concluir os comentários sobre a novela de Gilberto Braga, tem valido a pena ver O Dono do Mundo. Buscar entender os erros, a reação do público de 1991, e acompanhar as mudanças realizadas no roteiro para que a audiência voltasse aos trilhos pré-estabelecidos. A tal comentada cena da virada, em que Márcia fere Felipe com um bisturi, trouxe novos ares para a novela. Já estou roendo as unhas à espera do Felipe pobretão!

Tropicaliente não sopra forte como os ventos de Fortaleza. A novela de Walther Negrão é impregnada com o estilo do Ceará. Não só pelas paradisíacas locações, mas também pelos cenários e figurinos. Todos abusam dos tons claros, de vidros, madeiras, flores naturais. A concepção de Helena Brício (figurinos), Mário Monteiro (cenografia) e Tisa de Oliveira (produção de arte), dentre outros nomes, foi impecável. O colorido encantador, no entanto, se dissipa diante do desenvolvimento lento do roteiro. As cenas de dança na aldeia já irritam (e nós já sabemos que ainda serão vistas à exaustão). Mas se as coisas demoram a acontecer, ao menos acontecem com um texto muito bem elaborado por Walther Negrão. É como o ritmo de História de Amor, cujas tramas demoravam a se finalizar, mas permaneciam interessantes em virtude do texto de Manoel Carlos.

História de Amor, no entanto, além da trama romântica central bem elaborada, trazia diversas tramas paralelas que garantiram o gás necessário aos mais de duzentos capítulos da novela. O mesmo não se pode dizer de Tropicaliente. O fio condutor é bastante frágil e não evolui a contento. A paixão de Letícia (Sílvia Pfeifer) e Ramiro (Herson Capri), que deveria ser a principal trama da novela, é ofuscada pelo entrelaçamento dos personagens paralelos, com destaque para Açucena (Carolina Dieckmann, com uma imagem bastante diferente da que vemos hoje) e Vitor (Selton Mello). O psicológico fragilizado do rapaz é o grande destaque do texto de Negrão e da interpretação de Selton; de longe, o melhor desempenho do elenco. Ainda vamos ver muitas loucuras de Vitor, obcecado pelo poder e pela conquista.

O elenco, no geral, é interessante. Como é gostoso ver Carla Marins como Dalila, tão distante da Joyce de História de Amor; o mesmo para Ana Rosa, aqui como Ester, e Stenio Garcia, cujo Samuel nada lembra o Herculano da novela da meia-noite. Lúcia Alves (Isabel), Cinira Camargo (Manoela), Nelson Dantas (Bujarrona) e os protagonistas Sílvia Pfeifer e Herson Capri se destacam. Ao lado de Selton Mello, a ótima Paloma Duarte dá o tom perfeito à sua ainda menina e já obstinada mulher Amanda. Quem também merece menção honrosa é Cássio Gabus Mendes, que consegue se safar bem do perfil excessivamente chato de Franchico. E Regina Dourado está fantástica como Serena. Já de cara a torcida para que ela consiga manter-se ao lado de Ramiro é muito maior do que a que quer o pescador com Letícia.

Tropicaliente não precisa ser acompanhada com afinco. Muitos capítulos irão passar sem que nada de realmente importante para o desenvolvimento da trama aconteça. Os imbróglios entre Letícia, Ramiro e seus familiares norteiam a novela até o fim, e chegam a ficar cansativos, tamanho é vai-e-vem envolvendo os personagens. Uma boa novela, que, entretanto, não figura entre as melhores do autor, nem entre as mais interessantes das que já foram exibidas pelo Viva.

3 comentários:

  1. No início do texto está escrito Tropicaliente, ao invés de História de Amor a antecessora de Tropicaliente.

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  2. Olá! Já corrigi o erro. Obrigado pelo alerta! =D

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  3. Acredito que Tropicaliente teria se beneficiado de uma exibição compacta como foi no vale a pena ver de novo com mais ou menos 80 capítulos.

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