segunda-feira, 24 de novembro de 2014


Viva o Palco Viva!
Novas edições comprovam a falta que musicais fazem à TV

O Globo de Ouro Palco Viva, estreia da última segunda-feira (17), é mais uma empreitada do Canal Viva na consolidação de suas produções próprias. Assim como as reedições do Sai de Baixo, veiculadas ano passado, a atração padece com as inevitáveis comparações. No entanto, diferentemente do programa humorístico, sempre atual, o Globo de Ouro Palco Viva aposta em um formato hoje praticamente extinto na televisão brasileira. Exatamente por este motivo, a atração exigiu muito cuidado em sua concepção e execução. E o Viva se saiu muito bem nessa recriação.

Os tempos são outros. A TV mudou. A forma de se ouvir música não é mais a mesma. Estamos longe de ficar, como nos anos 80, a espera de uma atração que nos apresente a parada de sucesso da semana, fosse ela veiculada no rádio ou na TV. Portanto, o Globo de Ouro Palco Viva surge como uma tentativa de se estabelecer, novamente, o hábito de se consumir música no meio televisivo e reatar o vínculo do público com grandes nomes do cenário musical brasileiro; hoje, em franca decadência. Sendo assim, talvez não fossem necessárias as apresentações de cantores atuais, com seus hits exaustivamente disseminados em playlists Brasil afora e a imagem desgastada pela exposição constante. O Globo de Ouro Palco Viva ressuscitaria apenas os elementos que fizeram seu sucesso no passado, e que, ao que parece, garantiram a repercussão destas novas edições: durante a apresentação de músicos tarimbados, as redes sociais registraram grande soma de comentários elogiosos. O mesmo não se viu quando cantoras como Anitta e Valesca Popozuda subiram ao palco, completamente deslocadas das outras atrações exibidas. Poderíamos ter tido a chance de apreciar apenas os profissionais “das antigas”; hoje, infelizmente, quase que em sua maioria, ignorados pela grande mídia.

A presença de novos nomes nas reedições de determinadas músicas, no entanto, foi uma escolha acertada. Certos talentos que já nos deixaram não poderiam ficar de fora desta nova versão da parada musical. Caso de Agepê, muito bem defendido por Diogo Nogueira, com ‘Deixa Eu Te Amar’. E também de Renato Russo e seu Legião Urbana, cuja voz de Thiaguinho enalteceu ‘Será’ e prejudicou ‘Pais e Filhos’, tamanha foram as firulas do cantor na tentativa de recriar a canção. A ótima Panamericana também reverenciou o Legião Urbana, assim como Cazuza, e ainda prestou uma homenagem aos Titãs. É pena que a banda não tenha participado, por falta de convite ou incompatibilidade de agendas, conforme acontecera com Rosanah. O mesmo para Rita Lee, cuja ‘Mania de Você’ foi muito bem defendida por Tulipa Ruiz. Cabe também elogios a Nina Becker, que veio com ‘Frisson’, de Tunai. Não se pode incluir neste meio, no entanto, a versão de Marcelo Janeci para ‘Menina Veneno’, do Ritchie.

O repertório selecionado para a atração tem se mostrado interessante. Alguns deslizes não chegaram a comprometer, mas merecem ser anotados: ‘Ouro de Tolo’, nem de longe, é uma das melhores composições de Raul Seixas, e tampouco fora bem executada pela banda Tono. E Alcione, ao entoar ‘Meu Ébano’, flertou com as novas gerações, mas desprezou as antigas, acostumada a ver a Marrom no palco do Globo de Ouro cantando sucessos como ‘Estranha Loucura’. O episódio “novelas”, exibido na última sexta, trouxe Guilherme Arantes em sua melhor forma, como há muito tempo não víamos. E mostrou que Baby do Brasil ainda ostenta os deliciosos timbres de quando ainda era Baby Consuelo e embalava Água Viva com o seu ‘Menino do Rio’. O mesmo para Ney Matogrosso e Milton Nascimento, com uma das melhores apresentações até o momento (‘Coração de Estudante’, com Wagner Tiso). Infelizmente, outros cantores foram prejudicados pela ação do tempo. É delicioso rever Kátia, Peninha e Dalto, nomes hoje pouco lembrados, e triste constatar que Sidney Magal não possui o mesmo tom de outrora.

O canal acertou ao abrir as novas edições do programa com um retrospecto da trajetória do Globo de Ouro. É importante contextualizar as novas gerações, que desconhecem a importância da parada musical para a TV, para os músicos e o grande público. Nas edições da atração e nas cenas dos próximos capítulos das novelas da época é que tínhamos acesso a novos hits. Um tempo longínquo deste de agora, em que qualquer um publica sua canção na internet e em instantes pode ser alçado ao mais novo ídolo do Brasil (o próprio site da atração dá essa possibilidade aos visitantes no “Momento É Com Vocês”). O Globo de Ouro era a consagração de muita gente que batalhou para viver de música até chegar aos dez mais.

E apresentar o Globo de Ouro também era sinônimo de sucesso. Que o diga César Filho, até hoje reverenciado pelo seu desempenho em frente à atração, fosse acompanhado por Cláudia Abreu, Cláudia Raia ou Isabela Garcia (a mais famosa das apresentadoras). Juliana Paes e Márcio Garcia estão muito bem nas passagens entre os números musicais. Embora não haja a aparente espontaneidade existente nas edições da TV Globo, podemos constatar que o texto elaborado conseguiu passar a impressão de entrosamento necessária à dupla.


Até o final da semana, temos ainda quatro edições do Globo de Ouro Palco Viva. O resultado final parece excelente, apesar dos pequenos deslizes aqui citados. Uma ode ao passado, uma grande homenagem a talentos da música, e um alerta para as novas gerações: músicas e músicos surgem e permanecem através de uma carreira calcada em trabalho, parcerias e boas composições; não em sucessos efêmeros e capas de revistas. Que possamos ver mais edições deste especial e também do Globo de Ouro original (cujos episódios dos últimos anos de existência já foram exaustivamente reprisados).

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